sábado, 22 de fevereiro de 2014

Princípios secundários


Klee

Os defensores da utilidade são frequentemente chamados a responder a objeções como esta – que antes da ação, não há tempo para calcular e pesar os efeitos de qualquer linha de conduta na felicidade geral. Isto é exactamente como se alguém dissesse que é impossível guiar a nossa conduta pelo cristianismo, já que, sempre que tenha de se fazer alguma coisa, não há tempo para ler todo o antigo testamento.


A resposta a esta objeção é que tem havido muito tempo, nomeadamente todo o passado da espécie humana. Ao longo de todo este tempo, a humanidade tem vindo a descobrir tendências das ações através da experiência, dependendo dessa experiência toda a prudência, bem como toda a moralidade da vida. As pessoas falam como se o começo deste curso de experiência tivesse sido posto de parte até aqui, e como se, no momento em que um homem se sente tentado a intrometer-se na propriedade ou na vida de outro, tivesse de começar a considerar pela primeira vez se o assassínio ou o roubo são prejudiciais para a felicidade humana. Penso que, mesmo neste caso, ele não consideraria a questão muito enigmática, mas, seja como for, a questão hoje chegar-lhe-ia resolvida às mãos. É realmente estranho supor que, se os seres humanos tivessem concordado quanto a considerar a utilidade  como teste de moralidade, permaneceriam sem qualquer acordo  a respeito daquilo que é útil e não tomariam quaisquer medidas para que as suas noções sobre o assunto fossem ensinadas aos jovens e inculcadas pela lei pela opinião.(…) É estranho pensar que um primeiro princípio é inconsistente com a aplicação de princípios secundários. Informar um viajante sobre o lugar do seu destino último não é proibir o uso de pontos de referência e de sinais pelo caminho. A proposição de que a felicidade é o fim e o objetivo da moralidade não significa que não se possa construir qualquer estrada para atingir esse objetivo, ou que as pessoas que seguem para lá não devam ser aconselhadas a seguir uma direção em bez de outra. (…) seja qual for o princípio que adoptemos como princípio fundamental da moralidade, precisamos de princípios subordinados através dos quais possamos aplica-los; a impossibilidade de passarmos sem eles, sendo comum a todos os sistemas, não poide proporcionar qualquer argumento contra um em particular (…)

                                                                      J.S. Mill, Utilitarismo



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