domingo, 26 de abril de 2015

A mistura de fatores objetivos e subjetivos na escolha das teorias




 (…) Mas devemos ir além da lista de critérios partilhados para as características dos indivíduos que fizeram a escolha. Quer dizer, há que lidar com características que variam de um cientista para outro sem com isso arriscar minimamente a sua aderência aos cânones que tornam científica a ciência. Embora tais cânones existam e devam ser descobertos (sem dúvida, os critérios de escolha com que comecei estão entre eles), não são por si suficientes para determinar as decisões dos cientistas individuais. Para esse propósito, os cânones partilhados devem estudar-se de maneiras que diferem de um indivíduo para outro.

(…)
Algumas das diferenças que tenho em mente resultam da experiência anterior do indivíduo como cientista. Em que parte do campo trabalhava ele, quando se confrontou com a necessidade de escolher? Por quanto tempo trabalhou nele; qual foi o seu êxito; e quanto do seu trabalho dependeu de conceitos e técnicas impugnados pela nova teoria? Outros factores importantes para a escolha ficam fora das ciências. A eleição de Kepler pelo copernicanismo ficou a dever-se em parte à sua imersão nos movimentos neoplatónicos e herméticos da sua época; o Romantismo Germânico predispôs aqueles que afectou para o reconhecimento e a aceitação da conservação da energia; o pensamento social britânico do século XIX teve uma influência semelhante sobre a disponibilidade e aceitabilidade do conceito de Darwin da luta pela existência. Ainda outras diferenças significativas são funções da personalidade. Alguns cientistas põem mais ênfase do que outros na originalidade e têm mais vontade, portanto, em tomar riscos; alguns cientistas preferem teorias compreensivas, unificadas para soluções de problemas exactos e pormenorizados de alcance aparentemente mais restrito. Factores diferenciadores como estes são descritos pelos meus críticos como subjectivos, e são postos em constraste com os critérios partilhados ou objectivos de onde parti. Embora mais à frente ponha em questão este uso dos termos, vou aceitá-los por enquanto. Defendo que toda a escolha individual entre teorias rivais depende de uma mistura de factores objectivos e subjectivos, ou de critérios partilhados e individuais. Visto que os últimos em geral não aparecem na filosofia da ciência, o meu realce sobre eles fez que a minha crença nos primeiros não tivesse sido apercebida pelos meus críticos.

                                                            Kuhn, A Tensão essencial


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